A estética é uma área da filosofia que estuda a natureza da arte e sua relação com os seres humanos.
Mas o valor estético (a beleza) é uma propriedade do objeto/fenômeno ou um modo de um sujeito perceber um certo objeto/fenômeno?
Enquanto alguns argumentam que a beleza e o valor estético são determinados exclusivamente pelos gostos e percepções individuais, outros defendem que há critérios objetivos para a avaliação estética.
Essas duas posições são conhecidas como subjetividade estética e objetividade estética, respectivamente.
A “subjetividade estética” e a “objetividade estética” são conceitos fundamentais na estética e na filosofia da arte.
A diferença entre eles está relacionada à forma como percebemos e avaliamos a arte.
Como veremos, a subjetividade estética enfatiza a importância das emoções e experiências pessoais na experiência estética, enquanto a objetividade estética enfatiza a importância de critérios objetivos na avaliação da qualidade da obra de arte – como sua estrutura formal e as técnicas utilizadas pelo artista.
Ambas as perspectivas são importantes para entender como percebemos e avaliamos a arte, e o objetivo deste texto é apresentar as principais ideias desses conceitos e apresentar uma conciliação entre essas duas visões aparentemente opostas.
Reduziremos as respostas a três perspectivas fundamentais: objetivismo, subjetivismo e uma mescla destas duas que tenta integrá-las.
A seguir veremos os princípios básicos destes entendimentos que se propõem a explicar as fontes da qualidade estética.
O objetivismo concebe o objeto como o que existe em si e por si, à margem de qualquer relação com o sujeito, seja qual for essa relação e o modo como é concebido pelo sujeito.
A objetividade estética reconhece que a obra de arte é um objeto autônomo, que existe independentemente da experiência individual do observador.
Os antecedentes dessa concepção estética já são encontrados na Antiguidade grega desde os pitagóricos, para os quais a beleza é uma propriedade do universo e das coisas e, portanto, o que se percebe como belo existe independente de ser percebido ou não.
O sujeito limita-se a perceber a beleza nos objetos e só lhe cabe descobrir o que já existe – não importando a sua relação com ele.
Tal ponto de vista defende que a fonte da qualidade estética está em certas qualidades das coisas e da natureza e se manifesta em certas estruturas formais (simetria, proporção, harmonia, etc), e associadas a determinadas fórmulas ou relações matemáticas (como é o caso da “seção áurea” ou “número de ouro”).
Portanto, o objetivismo enfatiza a importância de critérios universais, tais como a harmonia, a proporção, a simetria e a coerência, que podem ser aplicados para avaliar a qualidade estética de uma obra de arte.
Essa perspectiva tem sido defendida por muitos filósofos, desde Immanuel Kant até Clive Bell.
De certa maneira, o objetivismo estético radical não admite multiplicidade de significados, ou “inserir” um significado (emocional, expressivo) que não “pertence” ao objeto/experiência, pois as qualidades definidas pelo próprio objeto são o que são – e apenas o que são, nada mais –, portanto, não mudam de acordo com quem as observa ou de como se observa.
Portanto, a qualidade estética de uma obra de arte pode ser avaliada de forma objetiva, sem levar em consideração as opiniões pessoais e subjetivas dos indivíduos que a experimentam.
No caso de uma composição musical, são levados em conta aspectos como: técnica, coerência, unidade, originalidade, complexidade, entre outros atributos.
A partir desta perspectiva, uma obra de arte pode ser considerada bela ou de alta qualidade com base apenas em seus atributos técnicos, independentemente das opiniões pessoais dos indivíduos que a experimentam.
É como se o valor estético já estivesse contido na estrutura do objeto artístico e o sujeito apenas “testemunha” seus significados sem contribuir nem interferir em nada.
Em última análise, se o observador não tem influência nenhuma sobre a qualidade estética de uma obra de arte, então isso quer dizer que, segundo a perspectiva da objetividade estética, só há uma interpretação possível para cada obra.
Só há uma interpretação “correta” – ou, na melhor das hipóteses, algumas poucas possibilidades de interpretações diferentes.
Diametralmente oposta à perspectiva objetivista que desconsidera o papel do sujeito na manifestação da qualidade estética, está o subjetivismo, que absolutiza o papel da subjetividade, deixando de lado as qualidades e os fatores objetivos da relação estética com o objeto.
A subjetividade estética se refere à ideia de que a experiência estética é pessoal e única para cada indivíduo.
Ela destaca a importância do sujeito na apreciação da obra de arte, reconhecendo que o gosto estético de cada pessoa é influenciado por suas experiências pessoais, emoções, educação, cultura e tempo histórico em que vive.
É uma maneira do sujeito “interpretar” as coisas do mundo, inclusive as obras de arte.
De certa forma, a ideia radical da subjetividade encarna a ideia dos sofistas, da qual o homem era a medida de todas as coisas e, portanto, também da beleza.
Ou seja, é a mente humana que faz as coisas parecerem belas.
Assim, a fonte da estética é transposta do objeto para o sujeito.
Só o fato de algo ser entendido como “belo”, já denota a percepção de uma mente.
“A beleza não é nenhuma qualidade das coisas em si mesmas. Existe na mente de quem as contempla, e cada mente percebe uma beleza diferente”. (David Hume)
O subjetivismo contém em si esses dois aspectos fundamentais: a negação das qualidades objetivas e a absolutização do papel do sujeito.
Não há objeto estético se o sujeito não o converte em tal ao interessar-se por ele.
O juízo de valor estético que empregamos é o que determina a nossa posição e interpretação sobre um determinado objeto ser ou não belo, ser ou não uma obra de arte, ter ou não ter valor estético/artístico, e assim por diante.
Estes juízos são pessoais, mas são influenciados pelo contexto cultural e tempo histórico que estamos inseridos, portanto, estão sujeitos a mudanças.
Segundo a perspectiva do subjetivismo estético, é impossível encontrar um juízo universal acerca de determinada obra de arte, porque a arte não tem valor intrínseco em si: não há critérios absolutos que tornam certo objeto belo ou não para todas as pessoas.
O valor estético deriva do interesse do sujeito e não das qualidades do objeto.
Uma grande queda d’água – como uma catarata –, por exemplo, carece de valor estético até que uma sensibilidade (mente) humana a considere sublime. Ou seja, a catarata não é sublime em si, necessita do sujeito que a perceba e considere como tal.
O mesmo ocorre em relação às artes.
Por exemplo, na música, é quase impossível haver objetividade.
As razões que levam uma pessoa gostar da “5ª Sinfonia” de Beethoven e outra pessoa da música “Que tiro foi esse” de Jojo Todynho são diferentes, uma vez que não só as obras são diferentes entre si, mas também os critérios de cada indivíduo são diferentes: dependem de seu background cultural, seu senso de identidade, diferenças de educação, modos de vida e visões de mundo.
Mas aí surge uma pergunta: se a beleza está 100% “nos olhos de quem vê”, então o que diferencia um objeto qualquer de uma obra de arte?
Algumas obras que desafiaram essa noção de subjetividade extrema foram Urinol (1917) do artista plástico francês Marcel Duchamp e a obra 4:33 (1952) do compositor americano John Cage.
Tanto o objetivismo quanto o subjetivismo têm sua parcela de verdade quanto à fonte da qualidade estética, mas erram ao tentar chamar para si toda a explicação do fenômeno e ignorar o “outro lado”.
O objetivismo reduz o papel do sujeito a um simples registro do já ocorrido esteticamente no objeto em si, sem que participe ativamente em sua constituição.
O objetivismo estético baseia o estético em certas estruturas formais, associadas a certas propriedades – simetria, harmonia, proporção. No entanto, cabe observar que a mera presença dessas características não basta para que os objetos em que estas ocorrem adquiram um valor estético.
A simetria, por exemplo, não é garantia de esteticidade, já há objetos que são considerados belos sem que sejam simétricos, ou, ao contrário, que são simétricos, mas não são belos.
No que diz respeito às fórmulas matemáticas que regem certas estruturas formais (número de ouro, sequencia de Fibonacci), pode-se afirmar que essas fórmulas “são encontradas também em inúmeras obras medíocres”, ou seja, sem valor estético.
Já o subjetivismo absolutiza o papel do sujeito, portanto, transforma o objeto numa mera projeção de uma faculdade sua e dá a esta faculdade uma dimensão universal, sem levar em conta fatores históricos.
No entanto, o sujeito não vive num vácuo, isolado do seu contexto histórico e social. Muito pelo contrário, ele está permeado pelo complexo ideológico que rege sua respectiva época, e está submerso pelos embates sociais e culturais.
Portanto, o sujeito reflete toda esta carga histórico-sócio-cultural em todos os julgamentos de valor que venha a fazer, inclusive nos julgamentos de cunho estético.
Neste sentido, o sujeito não carrega uma subjetividade isolada e única, mas uma subjetividade inserida em um contexto particular.
Uma visão balanceada entre essas duas perspectivas sugere que não significa que basta a intervenção do sujeito para que este considere qualquer objeto belo ou sublime, por exemplo, algumas características precisam estar contidas neste objeto para que, ao contrário de outros objetos, este em particular provoque no sujeito o sentimento de beleza ou sublimidade.
Enquanto não há relação com o sujeito o objeto estético só existe potencialmente, ou seja, só passa a existir efetivamente ao se tornar um objeto para o homem que, em determinadas condições sociais e históricas, assume um determinado paradigma estético.
Só quando a ideologia estética (presente na mente do indivíduo) existe e está estabelecida numa certa sociedade é que se criam as condições para que se produzam os encontros concretos, singulares, entre sujeito e objeto que chamamos de situações/fruições estéticas.
É nesse cenário que os objetos dotados de certas qualidades (portanto, não qualquer objeto) adquirem uma existência estética efetiva.
Enquanto não entra em uma situação estética concreta (enquanto não é percebido ou contemplado), o objeto, mesmo possuindo as qualidades ou propriedades necessárias, só possui um potencial estético. Para que possa realizar sua “esteticidade” (ou seja, passar do mero potencial), exige-se a participação do sujeito. Só então o objeto “revela” sua forma sensível à qual é imanente um significado e, ao percebê-lo, o sujeito não inventa essa forma nem esse significado.
Portanto, se o objeto prescindisse destas formas e significados, não se realizaria a “esteticidade” do objeto (que é o que não entende o subjetivismo).
Por sua vez, prescindindo da intervenção do sujeito, tal encontro (entre sujeito e objeto) não alcançaria um plano estético (e isso é o que o objetivismo não entende).
Concluindo, a fruição estética (ou a possibilidade de existir um valor estético), não se trata de uma habilidade universal aplicável a qualquer objeto, mas sim de um “interesse” que surge e se mantém na relação do sujeito com um objeto que possui certas qualidades.
Ou seja, o valor estético e os significados de uma obra de arte não “irradiam” das propriedades físicas e sensíveis do objeto, mas sim da interação com os indivíduos em suas respectivas particularidades.
O assunto deste artigo diz respeito ao valor estético, mas numa obra de arte também podem existir valores de outras ordens, tais como sociais, políticos, históricos, morais, religiosos, etc.
Muitas vezes uma obra acaba sendo valorizada por causa destes parâmetros, e não a partir de seus atributos especificamente estéticos.
Sem dúvida estes valores têm sua importância, mas devem ser compreendidos como aspectos de segunda ordem, ou seja, não devem ser centrais em uma obra de arte, apenas complementares.
Numa sociedade baseada no individualismo, a visão subjetivista tende a prosperar, já que cada pessoa acredita que possui uma perspectiva única sobre tudo e, consequentemente, por ser única, “é muito especial”.
Quando a subjetividade (ou seja, o “gosto” individual de cada pessoa) se torna o único ponto de referência para avaliar o valor da arte, é inevitável termos por consequência o total relativismo da arte e uma impossibilidade de debate fora dessa perspectiva.
É aqui que as teorias subjetivistas possibilitam o relativismo do valor da arte, da inexistência de valores estéticos objetivos. Se cada sujeito é único e fruirá da obra à sua maneira, então não é possível falar de valores objetivos, mas apenas de valores subjetivos, ou seja, do gosto pessoal. É extremamente comum ouvirmos as frases “arte é subjetiva” ou que é uma “questão de opinião”. Esse tipo de pensamento abre caminho para um relativismo total da obra de arte, na qual toda e qualquer interpretação está correta e é válida.
Por isso é que é tão difícil falar objetivamente sobre uma música, um estilo ou um gênero musical ser bom (ter valor estético) ou ruim (não ter valor estético), por exemplo, porque sempre pode haver o argumento que “se você não está percebendo o valor estético dessa música é por que você não possui o background sociocultural necessário para compreendê-lo”; ou porque “você está tentando encaixar esta música num modelo estético que valoriza outros atributos”.
É evidente que uma obra de arte pode ter diversas interpretações, contudo, é prudente se prevenir de uma relativização total da objetividade dos valores estéticos. O relativismo extremo, tão comum nos nossos dias, deve ser sempre avaliado com cautela e, quando necessário, questionado através de uma crítica pautada nos valores intrínsecos da obra de arte, nos valores estéticos objetivos da obra em si, e não a partir apenas de gostos subjetivos e preferências de modas artísticas passageiras.
Esse movimento se faz necessário porque a balança do valor estético pendeu desproporcionalmente para o lado do subjetivismo e relativismo. É necessário propor uma visão mais balanceada e próxima da realidade do mundo estético.
Não se deve confundir o valor intrínseco de uma obra de arte com as flutuações dos gostos e das modas de determinado momento histórico. Da mesma forma que uma obra antiga pode renovar sua importância em outro momento histórico, uma obra que marcou época pode se mostrar totalmente irrelevante com o passar dos anos.
Se o valor da obra é autêntico, ele não se depreciará com o passar do tempo. Ou seja, não estará submetido às questões de gostos e preferências de determinado momento histórico.
As obras que possuem um valor intrínseco, que atendem às categorias estéticas objetivas, perduram ao longo das diferentes épocas, visto que a obra supera a particularidade histórica na qual foi produzida, e supre necessidades intelectuais, emocionais e artísticas do gênero humano.
Neste vídeo explico mais detalhes e dou mais informações sobre o artigo que vimos aqui. Aproveite e se inscreva no canal.
Gandhi Martinez
Sou compositor, pianista, arranjador e educador musical há mais de 15 anos. Sou graduado em Música, Mestre em Interpretação e Criação Musical e Doutorando em Processos Criativos (Composição Musical). Já figurei na lista dos 21 melhores instrumentistas do Brasil com o meu primeiro CD. Já lancei diversos trabalhos com minhas composições autorais (4 CDs, 2 DVDs, 1 EP e diversos singles).
Minhas composições vão desde a canção popular brasileira até a música instrumental popular e peças eruditas. Atualmente, além do Doutorado, estou me dedicando a compor minhas próprias canções e a ensinar outras pessoas que estejam interessadas em compor música.
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